domingo, 25 de maio de 2008

NEGRO SPIRITUALS - UM CANTO DE LIBERDADE


A musica sempre esteve presente nas aspirações e lutas por liberdade dos negros desde que nas Américas, aportaram trazidos como escravos. Deles foi roubado, sua língua, família, e grande parte de sua cultura; ainda assim seus opressores não puderam remover a sua música, que era a expressão da alma deste povo. Ano após ano esses escravos e seus descendentes aceitaram o cristianismo que era a religião de seus senhores. A Musica era parte integrante do dia a dia do africano e era usada nos trabalhos, nas caçadas, nas festas, enfim toda a atividade era pontuada com musica. O poder desta musica da Diáspora aparece como elemento condutor da grande herança ancestral e cultural da Mãe África. Por onde passou esta musica influenciou e deu novas formas às que já existia, quer seja na América do sul especialmente o Brasil, na América central e na América do Norte especialmente os Estados unidos, onde pela forte cultura de massa essa influencia se espalhou por todo mundo, Na forma primeiramente do Negro Spirituals e dos demais estilos dele derivados, como o Blues, Ragtime, Jazz, Gospel ... chegando até nossos dias com muito do que se ouve na mídia. Por ser transmitida oralmente muito do que se produziu da musica negra da Diáspora foi perdido ou modificado pelo tempo, mas sua essência se manteve e serviu de fonte inspiradora a muitos compositores como Lorenzo Fernandez, Villa Lobos, Brasílio Itiberê II, Ernani Braga, Hekel Tavares, Stephen Foster, Louis Moreau Gottschalk (que compôs uma variação sobre o Hino Nacional Brasileiro) , Harry Burleigh, Samuel Coloridge Taylor, George Gershwin, Scot Joplin, Rosamond Johnson Jerome Kern, Hall Johnson e outros, que com seus conhecimentos formais nos possibilitaram ter contato com este rico legado musical. Eu conceituaria o Spiritual em sua tradução mais simples: como o verdadeiro Espírito de um povo. O Musicólogo M. Kolinsky fez um estudo comparativo de Negro spirituals e Canções Nativas da África Ocidental, e muitos eram idênticos, ou intimamente aparentados em estrutura tonal (escala e modo). Um Spiritual que ficou mundialmente conhecido no arranjo de Bob Dylan (many Thousands Go) , No More Auction Block For Me, segundo Kolinsky é claramente idêntico a uma canção do povo Achanti (Gana). Do contato com as histórias bíblicas nasceu o Negro Spiritual ou Plantations Songs, um poderoso gênero que se tornou um dos elementos mais significativos da música americana. Nestas melodias simples eles expressaram o modo como eram tratados; suas labutas, suas dores, a brutalidade e a opressão a que eram submetidos, mas também expressava a sua fé, esperança e alegria. Eles estavam proibidos de falar ou de fazer instrumentos musicais como o tambor que usavam freqüentemente na África para se comunicarem, mas lhes era permitido cantar o que quer que sentissem. Este cantar, transformou-se numa valioso instrumento de expressão e numa forma de atenuar a cruel e brutal vida de escravo. Utilizaram então os shouts (dança sagrada), os "hollers"(gritos) - que era um grito musical longo, subindo e descendo e atingindo o falsete-, que evoluíram para o Spiritual e para as Works Songs. Usavam também as canções como códigos para se comunicarem, particularmente quando se planejava fugas ou reuniões secretas. As primeiras informações sobre o uso destes códigos foram encontradas na autobiografia do abolicionista Frederick Douglas e posteriormente obtidas com depoimentos de ex-escravos.O Spiritual era criação expontânea e sem acompanhamento de instrumentos, e recebiam adornos de modo melhor servir aos cantores. Tem-se registro de aproximadamente 600 dessas canções , entretanto, a tradição oral na transmissão e a proibição aos escravos educados a lerem ou escreverem significou que muitos se perderam. Com o término da guerra civil americana em 1865 e a chegada da libertação,a maioria dos antigos escravos, procurou se manter longe da música do tempo de seu cativeiro. Com a criação do Coral Fisk Singers Jubilee da recém fundada universidade de Fisk de Nashville, Tennessee que iniciou uma turnê para levantar fundos para a escola e levaram o "Spiritual" a lugares dos Estados Unidos, que nunca tinham ouvido canções populares negras. Mas o Coral se apresentou também para a realeza durante suas excursões à Europa em 1870 e posteriormente em varias partes do mundo sempre com grande êxito.O sucesso do Fisk Singers Jubilee, incentivou outras faculdades negras a formarem grupos de cantores. Muitos historiadores musicais afirmam que o reconhecimento internacional do Negro spiritual veio com o mestre Tcheco Antonin Dvorák que habilmente colheu e usou o tema em sua Sinfonia do Novo Mundo. Dvorack que foi Diretor do Conservatório de Nova Iorque travou conhecimento com este gênero musical, com seu aluno Harry Burleigh, que cantava e tocava estas velhas melodias para ele. Burleigh que era cantor e compositor publicou em 1917 uma coletânea chamada "Deep River" que é considerada como sendo o primeiro trabalho desse tipo a ser escrito especificamente para ser interpretado por cantor que tivesse a sua voz treinada.Outro grande nome a descobrir o spiritual foi Samuel Coleridge Taylor (1875-1912) um renomado musico Afro-britanico que em 1904 por sugestão do editor da Musicians' Library , transcreveu dezesseis negro spirituals para o piano. Frederick Loudin um dos membros do jubilee singers foi quem primeiro mostrou a Samuel essa música popular do negra. Até esta época, o spiritual era considerado essencialmente para se cantar em grupo. Não havia nenhuma versão publicada para cantores solistas com acompanhamento de piano.As coletâneas de Spirituals tornaram-se muito populares com apresentações em concertos e gravações, feitas tanto por cantores negros como por brancos. E logo se tornou comum encerrar os recitais com uma seleção de espiritual. Músicos como Roland Hayes e Marian Anderson tinham estas canções em seus repertórios.À Paul Robeson porém, é creditado como sendo o primeiro cantor a dar um recital solo tendo no repertório somente "Negro Spirituals" e "Worksongs" em 1925, no Greenwich Village Theatre em Nova York.Estão entre grandes compositores e arranjadores Edward Boatner, Hall Johnson, Nathaniel Dett, Albert Tindley, Rosamond Johnson, William Dawson, Andrew Dorsey, Lawrence Brown, John Work III.Por vários anos foram publicadas numerosas coletâneas de "Negro Spiritual" especificamente para serem apresentados em concertos e grandes cantores de ópera como Leontyne Price, Grace Bumbry, Jessye Norman, Kathleen Battle, Barbara Hendricks, Simon Estes e outros, fizeram e fazem gravações e recitais com grande sucesso.Posteriormente o Spiritual deu origem a outros estilos da musica americana, incluindo o Blues, o Jazz ,Gospel, além de influenciar seguidas gerações de músicos em todo mundo, teve papel importante durante a luta pelos direitos civis nos anos 1950 e 60. Se apresentado em concertos, nas congregações, ou apenas ao cantar para si mesmo, o "Spiritual" deve ser cantado com a compreensão da força que inspirou essas poderosas canções, que as eleva acima das almas das mulheres e dos homens que as criaram. Os criadores dessas "folksongs" são desconhecidos e há muito tempo não estão mais entre nós, mas o desejo por liberdade e a sua fé continuam a encher os corações cada vez que se canta ou se ouve estas canções .

Um comentário:

Tati disse...

Texto muito interessante, principalmente pela mensagem de resistencia negra desenvolvida através da musicalidade. Parabéns por, com suas palavras nos lembrar que apesar de oprimidos nós negros encontramos estratégias para vencer os obstáculos que a sociedade insiste em construir.
Abraço, Tati Mendes.